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O anarquismo feyerabendiano

Paul Feyerabend (1924-1994), em Contra o método, parece concordar com o físico Thomas Kuhn ao definir a ciência como um "processo histórico heterogêneo e complexo" (1977, p. 230, grifo do autor), uma vez que Kuhn, em seu livro Estrutura das Revoluções Científicas, propõe que a ciência de Aristóteles não era mais limitada ou pior que a ciência de Newton, mas apenas baseada em um paradigma histórico diferente. Contudo, Feyerabend não se contenta em somente admitir que a ciência está sujeita a mudanças paradigmáticas determinadas pelas diferentes qualidades do tempo histórico. Ele vai além ao destacar que essa historicidade vem acompanhada de heterogeneidade; que a ciência não permanece fiel sequer ao seu próprio código genético, ou seja, ao método enquanto ímpeto [força interna] e pressuposto essencial da ciência. Para Feyerabend, o que é frequente no devir da ciência não é um desenvolvimento em conformidade com o método, mas, pelo contrário, em desconformidade com ele, de modo que forças como "a ignorância, a teimosia, a aceitação de preconceitos, a mentira, longe de impedirem a marcha do conhecimento, são seus pressupostos essenciais" (1977, p. 386). Contra essa perspectiva, segundo a qual deveríamos reconhecer que a ciência não se deixa governar pela arché do método, e sim por um anarquismo, voltam-se os monarquistas metodológicos Theocharis e Psimpoulos, que declararam ser Feyerabend "the Salvador Dali of academic philosophy and currently the worst enemy of science [o Salvador Dali da filosofia acadêmica e, atualmente, o pior inimigo da ciência]" (1987, p. 596). Mas o epíteto de "pior inimigo da ciência" parece injusto, pois o anarquismo feyerabendiano não exclui o método; pelo contrário, o inclui radicalmente dentro de uma estrutura passível de ser logicamente formulada como se p → ~p, em que p é o método adjetivado como hipótese acompanhada de implicação negativa, ou seja, tal anarquismo é uma lógica de pesquisa científica alinhada com a tradição da lógica antitética, de que são exemplos o fluismo heraclitiano, o idealismo hegeliano, etc.

Referência(s):
COSTA, Israel Alexandria. O anarquismo feyerabendiano. Arapiraca, AL: Grupo de Pesquisa Gnosiologia, Ética e Informação / CNPq / Ufal - Projeto Web Filosofia, 2021. Disponível em: https://www.gpgeinfo.org/p/fyrbndcnc.html. Acesso em: 7 maio 2021.
FEYERABEND, Paul Karl. Contra o método. Tradução Octanny S. da Mota; Leonidas Hegenberg. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1977. Tradução de: Against method.
KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. Tradução Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 11. ed. São Paulo: Perspectiva, 2011.
THEOCHARIS, T.; PSIMPOULOS, M. Where Science has gone wrong. Nature, Londres, v. 329, p. 595-598, out. 1987.

Atividade(s):
1) 405/pl/fc_s12